Abstract

Introdução. O trabalho de bombeiros é um dos trabalhos mais estressantes e perigosos, e envolve exposição frequente a eventos adversos e traumáticos, devido à própria natureza do seu trabalho. A exposição a um evento traumático é uma condição necessária, mas não suficiente para o desenvolvimento do Transtorno de Estresse Pós-Traumático (TEPT). As características da exposição traumática, a avaliação do evento, fatores pessoais (por exemplo, sexo, trauma pessoal, coping, alterações na saúde mental) e fatores organizacionais, podem determinar os resultados da exposição traumática. Objetivos. O objetivo principal deste trabalho doutoral foi determinar o efeito da exposição adversa do trabalho de bombeiros, o coping e a dissociação peritraumática na sintomatologia de estresse pós-traumático em bombeiros. Considerou-se secundariamente, a) descrever a exposição adversa do trabalho de bombeiro e o coping; e calcular as prevalências de saúde mental (sintomas de TEPT, dissociação peritraumática e sintomas psicopatológicos) dos bombeiros chilenos; b) comparar o coping, a dissociação peritraumática e os sintomas de transtorno de estresse pós-traumático em bombeiros chilenos que participaram e não participaram dos incêndios florestais de janeiro de 2017; c) identificar as variáveis demográficas, de exposição, de avaliação e psicopatológicas associadas à sintomatologia do TEPT; e d) avaliar a associação entre diferentes indicadores de exposição adversa no trabalho e sintomas de TEPT em bombeiros profissionais. Método. O presente trabalho de doutoramento inclui quatro estudos quantitativos transversais, que diferem nos objetivos, amostras e metodologias utilizadas. Os participantes dos estudos 1, 2 e 3 foram bombeiros voluntários chilenos de diferentes cidades do país e o estudo 4 foi realizado com bombeiros profissionais espanhóis da província de Albacete. Os dados foram recolhidos através de questionários auto-administrados para avaliar variáveis sociodemográficas (questionário sociodemográfico), exposição adversa do trabalho de bombeiro (QEAT-QPAT), trauma pessoal (LEC-V), coping (Brief-Cope), sintomas de stress traumático (PCL-V), sintomas de dissociação peritraumática (PDEQ) e psicopatologia (BSI) no caso da amostra de bombeiros chilenos. Na amostra de bombeiros espanhóis foram avaliadas variáveis sociodemográficas (questionário x sociodemográfico), burnout (MBI-GS), satisfação com o domínio do trabalho (WDSS), satisfação geral (Escala Cantril), clima organizacional (Questionário de Koys & DeCotiis), coping (Brief-Cope), dissociação peritraumática (PDEQ), exposição adversa do trabalho de bombeiro (QEAT-QPAT), e sintomas de stress traumático (PCL-V). Resultados. Descritivamente, a amostra de bombeiros chilenos está exposta a uma média de 24 eventos adversos no trabalho, com 2% de TEPT provável, 21% de dissociação peritraumática e 1% de sintomas psicopatológicos, sendo os estilos de coping mais usados o ativo, o de aceitação e de planificação. A escolaridade, o trauma pessoal, a frequência de exposição adversa, a avaliação do evento, os sintomas psicopatológicos, a dissociação peritraumática e o coping mal-adaptativo estão associados aos sintomas de TEPT. No caso dos bombeiros espanhóis, verificou-se que os três indicadores de exposição mostraram uma relação indireta com a sintomatologia de TEPT por meio do burnout e da dissociação peritraumática; as estratégias de coping mal-adaptativo estavam associadas com o burnout e a dissociação peritraumática, mas não com os sintomas do TEPT. Conclusão. A exposição adversa é parte do trabalho de bombeiros e as consequências desta exposição são variadas, sendo notória a presença de sintomas de saúde mental (sintomas de TEPT, dissociação peritraumática, psicopatológica e burnout). Embora as prevalências das alterações de saúde mental sejam baixas, é possível que este resultado se deva à presença de variáveis de proteção não estudadas; a literatura e os nossos resultados indicam que a presença destes sintomas e o uso do coping mal-adaptativo encontram-se associados com um aumento dos sintomas de TEPT, pelo que as intervenções preventivas nesta área devem considerar o trabalho de psicoeducação e formação no desenvolvimento de estratégias de coping mais adaptativas.